Carlos Acelino
VISIONÁRIO
Houve um tempo, no inicio da década de 60, que a BR 101 era apenas um projeto e um grande traçado que viria mais tarde dividir nosso município em duas metades.
Quando Hidalgo Araujo resolveu lotear suas terras, que partiam do atual trevo do Bela Vista até o chamado Travessão (altura da rua Itaguaçu), um padre holandês branquelo, de fala arrastada pelo péssimo português, recém chegado a Barreiros, ganhou quadra inteira do Loteamento Jardim Cidade de Florianópolis, para a construção de uma igreja. Sua visão empreendedora e futurística plantava, bem no coração daquele bairro, um belo cartão postal de São José, a Matriz Sagrados Corações.
Justino Corstjens contratou o competente arquiteto ilhéu Moisés Liz para elaborar o projeto daquela igreja esquisita, em madeira, que mais parecia uma tenda. Para as concepções da época, escandalizou a todos com seu projeto inovador, pouco elogiado, pois fugia aos padrões habituais das igrejas existentes, sendo uma espécie de Pampulha barreirense, bem ao estilo da nova capital federal do Brasil, recém inaugurada por Juscelino Kubitschek e planejada pelas mentes brilhantes de Oscar Niemeyer e Lucio Costa.
Em 12 de abril de 1964, logo após o golpe militar, Pe. Justino lançou a pedra fundamental e expôs a maquete da futura igreja na loja Hoepcke da Felipe Schimidt, iniciando sua luta incansável na busca dos recursos necessários ao intento. Nomeado Vigário de Barreiros e instalado na Casa Paroquial da Heriberto Hulse, iniciou uma campanha envolvendo a comunidade, empresários e classe política na busca dos recursos necessários. Alugou um imóvel à beira-mar, nela alojando os padres holandeses que vieram consigo e, na antiga casa paroquial ao lado da capela montou um cinema, que a principio só exibia slides, onde futuramente já se podia assistir ”O Gordo e o Magro”, tudo com ingressos bem baratos. Ali pude ver pela primeira vez “A Queda do Império Romano”, com Sophia Loren, Omar Sharif, Alec Guinnes e James Mason, obra épica que marcou nossas lembranças. Do lado de lá, ficava o salão paroquial, que desativou e alugou para Dona Norma montar uma padaria, onde vendia excelente pão de milho. Mais tarde, a família de Doralice Ramos Pinho, mãe do futuro Vereador Dauri Pinho, ali abriu um bar; mais uma ousadia do clérigo na busca da concretização de seu maior objetivo. O aquariano visionário foi mais além, comprando uma casa de madeira velha e o terreno ao lado da futura Matriz no Jardim Cidade, onde se instalou para acompanhar diuturnamente as obras, pois como diz o ditado, “o que engorda o gado é o olho do dono”.
Justino Corstjens nasceu na cidade de Holt-Gladbach, Alemanha, em 11.02.1913, tendo ido morar na Holanda com 3 meses. Seus pais, agricultores católicos, mandaram o filho Jacobus Hubertus Corstjens com 20 anos para o seminário, sendo ordenado sacerdote em 31.07.1938. Missionários na essência, os padres holandeses eram totalmente despojados de tudo, deixando trocar o próprio nome. Recém ordenado, veio para o Brasil, servindo seu ministério no Rio de Janeiro, como capelão de hospital em Patrocínio, Minas Gerais e na igreja São Luiz da Agronômica, de onde foi transferido para Barreiros. Com sua simplicidade e dinamismo, o sacerdote começou a fazer história, tendo agregado fieis escudeiros na sua faina, sendo seus principais colaboradores, Laudornino, da Coleta, Maria Laura, secretária geral e Coordenadora de Pastoral e da Ação Social, Maria Angelina, filha de Antenor Valentim da Silva, José Fernandes, Licínio Souza, Jorge Xavier, Manoel Medeiros Borges e José Carlos Cechinel, Vereador e Presidente do Legislativo; por várias vezes Presidente da Ação Social de Barreiros, com Sebastião Furtado Pereira, também Vereador, na tesouraria, os quais em 1970 entraram com projeto de lei na Câmara, dando seu nome para a rua em frente ao templo. Referido projeto também trocou o nome da rua Frontino Coelho Pires para Candido Amaro Damásio e deu o nome de Frontino na travessa posterior à igreja. Na mesma lei foi também nominada a rua Hidalgo Araujo. Para ajudar-lhe no comando da Paróquia Nossa Senhora de Lourdes, criada em 1912, e das capelas agregadas, a Senhor Bom Jesus de Potecas, de 1960, a Nossa Senhora dos Navegantes e São Pedro da Serraria, de 1958, a São Miguel e Santa Rita de Areias, 1975, a São José Operário, do Dona Adélia, 1977, trouxe para Barreiros vários padres, todos holandeses, dentre eles Padre Venâncio, que veio consigo, Agostinho Van Velsen, Agostinho Sielski, os padres brasileiros Claudio, José da Graça Simões, o Irmão Antônio e outros.
Ao lado da futura matriz cedeu espaço para o Governo do Estado instalar o primeiro posto de saúde de Barreiros, cuja sede definitiva, no Bela Vista foi por ele viabilizada. Fundou a Ação Social de Barreiros e adquiriu imóvel de frente para o cemitério, onde construiu o Instituto São José, lá montando uma fábrica de tijolos, imóvel que foi desapropriado pelo Município na gestão de Gervásio Silva, onde hoje está a Cidade da Criança e a Secretaria de Infraestrutura.
Com o andamento da obra, as Irmãs Franciscanas de São José compraram a quadra de trás da Matriz e, no terreno, foi construída a Casa Paroquial. No dia 01.01.1961, Justino chegou em Barreiros num jipe modelo candango, iguais aos que Juscelino utilizou para desbravar o Planalto Central na construção de Brasília. A bordo do estranho veículo, corria atrás dos recursos para as construções e foi buscar o primeiro telefone para Barreiros, que alguns diziam maldosamente ser nosso primeiro telefone público, o qual foi instalado na Casa Paroquial; entretanto, disponível para uso de todos. Na ocasião não existia uma única linha telefônica em Barreiros.
Justino Corstjens foi transferido para Minas em 1986, prestes a se aposentar. Anualmente vinha a São José rever sua Grande Obra e os amigos. Em 1990 recebeu medalha de mérito “Orange – Nassau” concedida pela rainha da Holanda por seu trabalho em nossa terra. Ao visitar sua família na Holanda, teve um mal súbito no aeroporto daquele país e faleceu em 06.11.1995. No ano de 2008, tantos amigos que cativou trouxeram seus restos mortais e os sepultaram em frente à Matriz, atendendo seu grande desejo manifestado em vida.
Pe. Justino assina convênio da LADESC, com Angela Amin. Presentes: Raul Thomás de Souza, Léo Xavier, João Vaz, Valcélio Nazaré dos Santos, Wilibaldo Wesler, Arnaldo Manchein de Souza, Tião Garbelotto e Nilton Severo da Costa. O menino é João Amin, Vereador de Florianópolis. (Foto cedida por Maria Laura Esterkotter de Souza).