quarta-feira, 30 de abril de 2014

Memória Política

Carlos Acelino 


Brasil Cativeiro

“13.05.1888: Lei Aurea foi o estopim para a  Proclamação da República”.


     Por mais de 350 anos o Brasil foi o principal cativeiro do ocidente. Nesse período todo trabalho e riqueza gerados no país enriqueceu a Coroa Portuguesa, o Império Brasileiro, os grandes proprietários, fazendeiros da cana-de-açúcar e do café e os extratores de ouro e diamantes. Riqueza construída com sangue, suor e lágrimas. Fontes históricas registram que dez milhões de africanos foram sequestrados de suas casas, amontoados nos navios negreiros e traficados para o continente americano, 40% deles para o nosso país. Com o inicio da industrialização na Europa as relações de trabalho e emprego sofreram mudanças em todo o mundo. A Inglaterra, maior potência dos séculos 18 e 19, aboliu o trabalho escravo em 1807, impondo um processo de perseguição aos países que se sustentavam na escravidão. Navios ingleses patrulhavam o litoral brasileiro, atacavam os portos, confiscavam as cargas humanas e julgavam e condenavam nos tribunais ingleses os mercadores, devolvendo os cativos à África.

A perseguição sem trégua ao comercio escravocrata internacional gerou mudanças na consciência nacional contra os que viviam desse lucrativo negócio, os quais compravam um indivíduo por 30 mil réis e o revendiam aqui por 20 vezes mais.
Embora uma lei de 1831, tenha abolido oficialmente o trafico negreiro ela nunca foi respeitada. O Brasil, maior território escravista do hemisfério, foi o ultimo país a acabar com a escravidão. Os últimos embarques ocorreram por volta de 1856. A Lei Eusébio de Queiroz, 1850, ficou no faz de conta. Tendo proibido a importação de escravos, ela gerou um tráfico interno de mais 300 mil homens. Donos dos engenhos de açúcar em decadência no nordeste passaram a vender seus escravos para os barões do café de São Paulo e Minas e o preço do mercado escravista triplicou de 1855 a 1875. O movimento abolicionista iniciou com o pioneiro Luís Gama, negro vendido pelos pais em dificuldades financeiras, que sentiu a escravidão na pele tornou-se advogado e passou a defender sua raça nos tribunais. O Imperador Dom Pedro II tinha muitas reservas contra o movimento, temeroso de ferir os interesses da aristocracia rural que sustentava a monarquia e queria, em caso de abolição, indenização maior que todo o Orçamento do Império. Para os abolicionistas eram os negros que deveriam ser indenizados por todo o mal a que foram submetidos em vida. A Lei do Ventre Livre, 1871, declarou livres doravante todos os nascidos, os quais poderiam morar com seus pais nas senzalas até os 6 anos e após, deveriam ser entregues ao governo, por 600 mil réis, o que pouco aconteceu.
Para o controle foi instituído o registro de nascimento nas paróquias e a Igreja Católica, em conivência com os escravocratas, fraudava as Certidões de Nascimento. Onze anos após a Lei apenas 58 crianças tinham sido devolvidas em todo o país. As demais foram mantidas no trabalho escravo e nas senzalas.
Mesmo assim o movimento tomou corpo, sendo a campanha com maior participação popular de nossa história, levando multidões aos comícios e manifestações públicas, provocando acirrados debates no Parlamento e empolgando a consciência de toda a nação. Panfletos, manifestos e livros contra a escravidão eram produzidos aos milhares e associações abolicionistas se multiplicaram. Ao movimento se juntaram figuras históricas como Joaquim Nabuco, Olavo Bilac, José do Patrocínio, Castro Alves, Rui Barbosa e o engenheiro André Rebouças. Em 1884 um panfleto anônimo pregava que “a escravidão é irmã gêmea da monarquia”.
José do Patrocínio era um jornalista agressivo e polêmico e Joaquim Nabuco filho do Padre João Carlos Monteiro, vigário de Campo dos Goitacazes, Rio de Janeiro, com uma de suas inúmeras escravas, das quais usava e abusava, tendo com elas inúmeros filhos, situação não diferente em todos os cantos do país. A igreja por seu lado fazia vistas grossas à escravidão e só se manifestou publicamente contra ela em 1887, pedindo a Isabel que o exército não mais fosse usado para caçar os escravos fugitivos, que já somavam cerca de 10 mil só em São Paulo.
Em 1885 saiu a Lei dos Sexagenários, libertando os poucos escravos que sobreviveram até os 60 anos. Para o movimento abolicionista libertá-los no fim da vida era abandona-los à própria sorte, justamente quando mais precisavam da ajuda de seus senhores. No ano de 1884, as Províncias do Ceará e Amazonas foram as primeiras a abolir a escravidão. Um episódio marcante chocou todo o país e acelerou a campanha. Em 1886, cinco cativos foram presos em Paraíba do Sul, Rio de Janeiro, acusados de matar o capataz. Um deles pegou prisão perpétua e os demais foram condenados a trezentas chibatadas, pena tão pesada, que levou três dias para ser cumprida. Ao final, os quatro foram obrigados a voltar a pé para as fazendas onde trabalhavam; dois deles morreram no caminho e os outros dois desmaiaram e foram transportados em carro de boi. Com o movimento em grande ebulição, medidas paliativas já não surtiam efeito e davam sinal da proximidade da libertação. Em junho de 1887 o Imperador, cansado e doente, foi para a Europa, deixando a regência do trono com a filha, Princesa Isabel. Com a batata quente nas mãos a princesa, pressionada até pelos dois filhos, libertou os escravos de Petrópolis, capital do Império e no 13 de maio assinou a Lei Áurea, abolindo a escravidão mas não o seu legado. Um legado de preconceitos e luta pela sobrevivência e melhores condições sociais, que perdura até hoje.

Fontes: Laurentino Gomes, “1889”; Mary Del Priori e Renato Venâncio, “Uma Breve História do Brasil”




quarta-feira, 23 de abril de 2014

Memória Política

Carlos Acelino 



Tiradentes e Tancredo

Heróis da Resistência, eles sonharam com um Brasil melhor”.


   Ambos eram mineiros da cidade de São João Del Rey e morreram em 21 de abril. O primeiro, Joaquim José da Silva Xavier, militar do Império Colonial português, no posto de alferes (hoje 2⁰ tenente), assumiu para si toda a culpa pela Inconfidência Mineira, 1792. Quando a Inglaterra mandava no mundo com suas dezenas de colônias, os ventos democráticos da “Liberdade, Igualdade e Fraternidade” varreram toda a Europa (abolição da escravatura nas colônias da Inglaterra, 1807, e da França, de 1894 a 1902, Declaração de Independência das 13 Colônias do Continente Americano, formando os Estados Unidos da América, 1776, Independência do Haiti em 1791).


No Brasil, a Inconfidência Mineira, iniciada com 24 cidadãos, 8 dos quais tiveram seus estudos na Europa, deu o ponta pé inicial para a Independência, 1822 e, cem anos após, a República. O movimento, delatado pelos portugueses Joaquim Silvério dos Reis, Basílio Brito Malheiros e Inácio Correia Pamplona culminou com a condenação de 11 membros à forca e ao degredo na África. Em 18 de abril saiu a sentença e só Tiradentes pagou o pato. 


Defensor ferrenho do movimento Tiradentes dizia que: “a Europa é como uma esponja que chupa toda a substância do Brasil e os Generais de 3 em 3 anos traziam para cá uma quadrilha ... que depois de comerem a honra, a fazenda e os ofícios que deviam ser dos habitantes se iam rindo deles para Portugal”.


Assumiu para si responsabilidade muito maior que sua participação no movimento e foi enforcado e esquartejado, as partes de seu corpo dispersas em quatro locais de Minas e a cabeça exposta na praça central de Vila Rica, lá deixados até que o tempo os consumisse (trecho da sentença). Sua casa foi incendiada e o terreno salgado. Tancredo de Almeida Neves foi a esperança de um novo Brasil após 21 anos de ditadura. Eleito pelo Congresso Nacional, seria o primeiro presidente civil a assumir a Presidência após o golpe, de 1964, o que nunca aconteceu, internado que foi às vésperas da posse com fortes dores no estômago, em razão de um tumor, apelidado de diverticulite por uma junta médica que não queria assustar a nação. Agonizou no Hospital de Base de Brasília e no Instituto do Coração em São Paulo por 38 dias, foi submetido a sete cirurgias e não venceu a luta contra a infeção que o vitimou às 22,20 horas de 21 de abril de 1985. A nação emocionada acompanhou tudo pelos jornais e TVs, os laudos médicos nas entrelinhas e a vã tentativa de ressuscitá-lo em várias crises respiratórios e cardíacas, uma comoção só comparada ao suicídio do Presidente Getúlio Vargas em agosto de 1954. Eu tinha a “idade de Cristo” quando Tancredo foi eleito com 480 votos do Congresso. Sete dias antes de eu completar 33 anos, 15 de janeiro de 1985, Tancredo, MDB, se elegeu Presidente contra Paulo Maluf, PDS, representante dos militares, que recebeu apenas 180 sufrágios. Para o intento, Tancredo costurou uma aliança com José Sarney, PDS, de vice, outro político seriamente comprometido com a ditadura. A oposição jogou com as cartas do governo, tendo sido antes derrotada no Congresso no movimento “Diretas Já”, (Emenda Dante de Oliveira) e, fez o jogo da eleição indireta, única forma de chegar ao Poder. Para tanto, dividiu os votos do Colégio Eleitoral, formando uma chapa com Sarney político da direita. Tancredo foi repórter policial, advogado, Promotor Público de sua cidade natal, Vereador, Presidente da Câmara, Deputado Federal mais votado em 1945, novamente Deputado Federal em 1950, e Ministro da Justiça de Getúlio Vargas. Lançou o mineiro Juscelino Kubitschek à Presidência e se tornou Diretor e Presidente do Banco do Brasil e do BNDE. Em 1958, tornou-se Secretário de Finanças de Minas e na eleição de 1960, perdeu a vaga de Governador para Magalhães Pinto. Com a renúncia de Jânio Quadros em 1961, articulou a posse do vice João Goulart na Presidência, num regime parlamentarista imposto pelos militares, do qual se tornou Primeiro Ministro. Eleito Deputado Federal em 1962, foi reeleito em 1966, 1970 e 1974. Em 1978, tornou-se Senador e foi eleito Governador em 1979, na primeira eleição direta nos Estados após o Regime Militar. O 21 de abril, véspera do descobrimento é data histórica da luta pela democracia.